Por habitar área com solo exposto, espécie endêmica corre risco de desaparecer por conta da retirada de vegetação para criação de gado e extração de madeira na Amazônia. Espécie habita as campinaranas amazônicas
Lucas Cardoso Marinho
Durante muitos anos, uma espécie de planta viveu sem ser conhecida pela ciência. Encontrada em uma área pouco explorada por biólogos no Maranhão, ela está associada a um ecossistema amazônico ainda desconhecido, as campinaranas.
Essa espécie é a Calea breviflora, ou maragaridinha-da-campina. Parte da família Asteraceae – a mesma dos girassóis, margaridas e cravos – a planta é muito parecida com essas espécies, mas tem tamanho bem menor: toda a inflorescência mede menos de um centímetro.
“Essa margaridinha possui pétalas e miolo amarelos e folhas alongadas que, quando amassadas, liberam um cheiro similar ao da menta. Normalmente estão nas margens da floresta em meio às gramíneas”, detalha o botânico Lucas Cardoso Marinho, professor da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).
Maragaridinha-da-campina (Calea breviflora)
Lucas Cardoso Marinho
Segundo ele, a espécie endêmica já “nasce” ameaçada para o mundo científico diante do crescente desmatamento na Amazônia, e pode desaparecer antes mesmo de ser completamente estudada. Desse modo, seu estado de conservação foi sugerido como Criticamente Ameaçada (CR).
“Esse achado mostra que o Brasil possui uma riqueza inestimável e que conhecemos muito pouco da nossa flora, fauna e funga. O Brasil é o país mais megadiverso do mundo e achados como esse demonstram que as pesquisas e os projetos de reconhecimento e proteção da nossa biodiversidade não podem parar”, ressalta.
A descoberta é parte da dissertação de mestrado da pesquisadora Mizalene da Silva, pelo Programa de Pós-graduação em Botânica Tropical do Museu Paraense Emílio Goeldi e Universidade Federal Rural da Amazônia.
Trabalho integra dissertação de mestrado da pesquisadora Mizalene da Silva
Lucas Cardoso Marinho
Após uma análise detalhada, os cientistas concluíram que os exemplares não correspondiam a nenhuma espécie conhecida. As coletas foram realizadas em duas localidades próximas: Boa Vista do Gurupi (MA) e Carutapera (MA), ambas a cerca de cinco metros de altitude.
O nome “breviflora” remete ao tamanho das flores, enquanto o nome popular “margaridinha-da-campina” remete à similaridade com as margaridas e a localidade onde a espécie foi encontrada.
Ecossistemas de areia branca
Os ecossistemas de areia branca da Amazônia incluem desde áreas costeiras, savanas e campinaranas. A margaridinha-da-campina foi coletada em uma área de campinarana, em um local de solo arenoso imerso em meio à vegetação densa floresta.
Essas áreas são como “ilhas”, de acordo com o especialista, pois abrigam muitas espécies endêmicas e diferentes da vegetação que a circunda. São áreas mais secas, com árvores baixas e tortuosas, plantas com folhas menores e adaptadas, semelhante ao que é visto nas caatingas do semiárido brasileiro.
Biodiversidade das campinaranas abriga diversos casos de endemismo
Lucas Cardoso Marinho
“À primeira vista, devido ao solo exposto, estas áreas parecem ser uma região desflorestada, justamente pela diferença do que tem ao redor. Isso leva à errônea interpretação de que ela já está em declínio, gerando uma onda de desmatamento para retirada de madeira e, especialmente, para a criação de gado”, explica.
Diversos trabalhos tem demonstrado que as campinaranas amazônicas são ricas em endemismo, tanto de árvores quando de plantas herbáceas, muitas delas ainda desconhecidas para a ciência. No entanto, esses são os primeiros dados organizados para a região.
“Devido à riqueza ímpar das campinaranas, a proteção mais eficaz a ser adotada seria a criação de unidades de conservação nestas áreas, regulamentando o acesso e a extração desenfreada de madeira e areia”, finaliza Lucas Cardoso.
Espécie endêmica ocorre em duas localidades no estado do Maranhão
Lucas Cardoso Marinho
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